sexta-feira, 17 de outubro de 2008

Sobre Cláudio Ulpiano - Reportagem da "Revista" - 28 de setembro

Segue abaixo uma reportagem sobre o professor de Filosofia Cláudio Ulpiano - por Karla Monteiro - morto em 99. Ulpiano deixou seguidores, apaixonados por suas aulas, que agora serão transcritas e transformadas em CDs para que todos possam conhecer o trabalho deste mestre.

Mora na filosofia
O professor Cáudio Ulpiano, que mexeu com as cabeças pensantes do Rio nos anos 80 e 90, ganha um site que traz registros de suas antológicas aulas

No final dos anos 70, um certo professor barbudo e meio maluco pulou os muros acadêmicos e levou a filosofia para a sala de estar. O nome dele era Cláudio Ulpiano, pensador de primeiro time e principal divulgador do ideário de Gilles Deleuze no Brasil. Sem cerimônia e sem compromissos formais, Ulpiano começou a ensinar filosofia a hordas de cariocas que passaram a segui-los pelos quatro cantos da cidade. Ele não tinha um endereço certo para dar aulas: ora reunia grupos na sua própria casa, ora em espaços públicos emprestados, ora na sala de algum dos seus alunos. Em 1999, Ulpiano morreu, deixando para trás muitos órfãos, entre eles apaixonados confessos como a atriz Cláudia Abreu e o cantor Paulinho Moska.
- Ele me deu a dimensão da liberdade, da eternidade, da curiosidade, me ensinou a compor o meu olhar, me deu uma peneira, um crivo - diz Moska. - Fui aluno dele por oito anos. Se não fosse o Cláudio, talvez eu tivesse me tornado um candidato a celebridade. Ele apagou em mim a banalidade.
- O Cláudio foi uma pessoa muito marcante na minha vida - comenta Cláudia. - Suas aulas eram especiais, porque ele conseguia falar sobre coisas complexas de uma maneira muito simples. Sua influência foi tão forte que acabei decidindo fazer a graduação em filosofia na PUC.
A paixão dos alunos de Ulpiano virou combustível para um mutirão em nome do resgate de sua obra. Apesar de escrever com maestria e de ter deixado alguns manuscritos, o filósofo era adepto da tradição oral - o que fez seus seguidores desenvolverem o hábito de gravar cada palavra que saía de sua boca. O material - mais de 800 fitas cassete com aulas do professor na íntegra - sempre ficou guardado na gaveta da viúva, Sílvia. Há dois anos, porém, Renata Aguiar, filha de Sílvia e enteada de Ulpiano, resolveu levar alguns minutos do discurso do padrasto para a internet. Choveu gente querendo saber de quem se tratava. Animadas, Sílvia e Renata se juntaram a uma turma de ex-alunos para conseguir verba para transformar as fitas em CDs e transcrever as aulas.
- Resolvi investir nesse trabalho porque todas as pessoas que eu encontro que foram alunas do Cláudio dizem que ele mudou suas vidas - diz Sílvia. - E eu acredito, porque ele mudou a minha. Então acho importante continuar.
O resultado é o Centro de Estudos Cláudio Ulpiano, um site onde é possível penetrar na essência do mestre (www.claudioulpiano.org.br) . Já estão disponíveis dez aulas transcritas e três áudios, além de textos de ex-alunos e amigos - sim, eles voltaram a se reunir, ainda que virtualmente, em nome do mestre. O site conta ainda com uma revista, a "Tigres Azuis", que dissemina o pensamento libertário do professor. Os textos da revista não são assinados, nem quando pertencem a escritores consagrados. Segundo a psicanalista Viviane de Lamare, ex-aluna de Ulpiano e uma das cabeças do movimento de resgate do seu trabalho, a idéia por trás da iniciativa comum é bastante simples: o sucesso de um texto não pode ser creditado a coisas externas ao próprio texto, como uma assinatura famosa.
- O Cláudio foi uma pessoa rebelde ao poder constituído. Ele tirou a filosofia da esfera da universidade e trouxe para a vida das pessoas. No próximo número da "Tigres Azuis", que será sobre o amor, teóricos consagrados escreveram textos maravilhosos e toparam não assinar - conta Viviane.
Ulpiano era fluminense de Macaé. Nasceu em 1932 e foi criado na Tijuca. Ainda na infância, começou a flertar com a filosofia, graças à vasta biblioteca de seu pai - ele leu "O Banquete", de Platão, aos 10 anos. Era, essencialmente, um autodidata. Sua formação acadêmica só aconteceu mais tarde, em meados dos anos 70. No final da década, ele virou professor da UERJ e da UFF. E, ao mesmo tempo, iniciou os famosos grupos de estudo, que reunia toda a sorte de gente, de intelectuais a estudantes. O desejo de ensinar livremente só se concretizou graças a Sílvia. Ela o conheceu durante um curso em Macaé, em 1978. Ali, decidiu que o apoiaria sem limites, para que ele pudesse se dedicar exclusivamente às idéias. Já no primeiro contato com o futuro marido, Sílvia teve certeza de que ele se tornaria um mestre, um guru. E assim foi. Segundo os amigos, ela tocava a parte prática da vida de Ulpiano, enquanto o filósofo se entregava a quatro coisas: pensar, ensinar, fumar e beber muito café.
- O Cláudio morava perto da minha casa. Quase todas as noites, ele chegava, mandava fazer dois bules de café e ficávamos conversando até esgotar as possibilidades de fala e escuta - conta Luiz Alfredo Garcia-Roza. - O Cláudio era autenticamente um filósofo. Muito mais do que um professor, era um pensador, que tinha uma característica rara: era generoso com o saber dele. Ele unia um pensamento original, uma inteligência brilhante e uma bondade de Papai Noel. Tudo isso combinado fazia dele uma pessoa fascinante.

segunda-feira, 8 de setembro de 2008

Como diagnosticar alunos disléxicos?

Pela segunda vez em minha vida profissional, deparo com a possibilidade de dislexia em sala de aula. Não possuo informações que considere eficientes para diagnosticar tal problema, o que me leva à procura de ferramentas com as quais possa contar.
Professores de Filosofia, Sociologia, História, Redação, etc., têm em mãos (em termos) a capacidade de perceber qualquer deficiência na escrita de seus alunos, visto que lidam com textos redigidos pelos mesmos. Porém, o diagnóstico para qualquer deficiência na aprendizagem é de responsabilidade de profissionais especializados, como psicólogos, psicopedagogos, entre outros.
Como, entretanto, lidar com esta questão, no caso de a instituição não possuir nenhum serviço de orientação pedagógica ou psicológica? E, além disso, no caso de o (a) aluno (a) não possuir condições materiais para a realização de um tratamento?
Vivenciei inúmeras vezes, em conversas em sala de professor e outras ocasiões, educadores referindo-se a alunos como disléxicos, portadores de déficit de atenção, hiperativos, dispráxicos, etc., todavia sei que a formação acadêmica em licenciatura de quase todas as disciplinas não confere a potencialidade para a realização de tais diagnósticos. Acredito, inclusive, que um diagnóstico errado pode gerar conseqüências tão drásticas quanto a ausência dele quando ocorre o problema.
O que sei, apenas, é que o interesse do professor em tais casos, acompanhado de bom senso, é primordial para sua resolução.

terça-feira, 22 de julho de 2008


Post reservado aos comentários da enquete:


"Aluno(a):Que tema abaixo você considera mais interessante nas aulas de Filosofia?"

domingo, 13 de julho de 2008

O Mito da Caverna em quadrinhos!

Olá, caros alunos e companheiros de profissão. Finalmente encontrei na net, através do blog do professor Fabian (nos meus links), "As Sombras da Vida", história em quadrinhos do Maurício de Souza que mostra, de forma bastante interessante, o mito da caverna de Platão. O que considero mais relevante nesses quadrinhos é a comparação estabelecida pelo desenhista com os nossos dias, comparação esta que revela uma sociedade que, bem como os prisioneiros do mito platônico, opta pela escuridão da caverna - uma caverna em forma de caixa, com "sombras multicoloridas", uma caverna cujas paredes estão em todos os lugares em que se ouve ou se fala sobre certos assuntos (como o entretenimento bobo das tardes de domingo), uma caverna que nada mais é do que nosso tão amado aparelho televisor.
Já utilizei estes quadrinhos em sala de aula, primeiro como estagiária durante a Licenciatura, depois como professora. Vale a pena, pois os alunos conseguem visualizar o mito - cuja compreensão é quase sempre difícil - de maneira mais clara e, óbvio, divertida.

Para efetuar o download de "As Sombras da Vida", clique aqui.

sexta-feira, 4 de julho de 2008

Lamentável

O texto que se segue é de autoria do economista e especialista em educação Gustavo Ioschpe, e foi publicado na revista Veja de 30 de junho. O presente texto reflete um pensamento intensamente hostil em relação à obrigatoriedade da Filosofia e da Sociologia no ensino médio, característico de uma publicidade "castradora", de uma mídia que, obviamente, não se interessa (pois isso, óbvio, não a permite continuar lucrando) pela formação de um pensamento crítico e autêntico - tarefa essencial da incorporação de tais disciplinas nos currículos escolares.


A ditadura da vontade própria, por Gustavo Ioschpe

Volta e meia ouvimos alguém protestar contra a suposta subordinação do nosso sistema educacional aos interesses do capitalismo. Haveria uma "ditadura do mercado" ditando as escolhas e interesses dos alunos e, por conseqüência, a orientação do próprio sistema escolar, que teria de abdicar de todas as suas funções mais nobres para preparar seus alunos para o mercado de trabalho.
A noção é triplamente ridícula. Primeiro, porque seria um elogio imerecido ao sistema educacional brasileiro a idéia de que ele consegue preparar a maioria de seus alunos para o mercado de trabalho ou para uma determinada orientação ideológica: é um sistema que mal consegue alfabetizar seus alunos. 72% da nossa população, segundo o Inaf (Indicador de Alfabetismo Funcional), não consegue ler e entender um texto simples. Segundo, porque a idéia de que o sistema educacional brasileiro é permeável às demandas da sociedade e espelha seus anseios é risível. Os desejos dos alunos e seus pais são irrelevantes; pesquisa após pesquisa mostra que professores e diretores buscam uma educação para a cidadania e para a politização, enquanto que alunos e seus pais vislumbram na escola a ponte para a ascensão social. Se a sociedade mandasse nas escolas, provavelmente veríamos nos currículos a inclusão de disciplinas de informática ou gerenciamento no Ensino Médio, ao invés da filosofia e sociologia, que acabam de ser impostas.
A "bancada da educação" no nosso Congresso é, em realidade, a bancada do professor: a maioria de seus membros são representantes de sindicatos da categoria, e se preocupam com os interesses dos alunos apenas nos casos em que ele coincide com aquele do sindicato dos professores, o que não costuma ocorrer com muita freqüência. Mas, terceiro e mais importante, a idéia é ridícula pelo próprio princípio que lhe é subjacente. Trata-se da velha idéia marxista da falsa consciência: a tese de que o pensamento dos oprimidos é, em realidade, fruto de introjeção causada pelos opressores. Sempre que o pensamento das classes mais baixas diverge daquilo que os oráculos marxistas decidiram ser o interesse dessas classes, é sinal de que o "proletário" teve sua capacidade de discernimento afetada pela superestrutura capitalista. É uma formulação deveras interessante: se um sujeito quer ir à escola para aprender coisas úteis e evoluir na vida, dando aos seus filhos uma existência melhor e mais digna do que aquela que teve, ele em realidade está sucumbindo à ditadura do pensamento dos outros, enquanto que se ele é obrigado, irrespectivamente de sua vontade, a aprender os ensinamentos de Marx, Engels, Rousseau e Durkheim (pois aposto que Adam Smith, Bentham e J.S. Mill não farão parte do novo currículo filosófico-sociológico), então, aí, sim, ele está exercendo sua democracia plena. O melhor árbitro das reais vontades de cada cidadão não é ele mesmo ou a sua vontade manifestada, mas sim a intelectualidade vanguardista e os arautos da revolução, que sabem das verdadeiras vontades de toda a humanidade, pois o intelecto e emoções de todo e qualquer ser humano é facilmente dedutível, na cosmovisão marxista: basta saber a que classe social o indivíduo pertence para saber de que lado da eterna luta entre os oprimidos e os opressores ele se situa.
Essa semana foram divulgados os resultados do último Saeb, o Sistema de Avaliação do Ensino Básico, referentes a 2007. Apesar da pequena e insignificante melhora em relação à última avaliação, de 2005, o quadro geral ainda é desolador. Nossos alunos não aprendem quase nada, e aprendem hoje menos do que conseguiam aprender em 1995. Não coincidentemente, na semana anterior a essa divulgação, foi sancionada a lei que obriga a inclusão de filosofia e sociologia nas escolas do Ensino Médio. Ensinaremos Sócrates e Hegel a alunos que não conseguem ler. Faz todo o sentido. Se o objetivo dos mestres é o doutrinamento, nada melhor do que espalhar suas ervas daninhas do pensamento maniqueísta e manipulador no terreno fértil da ignorância.

quarta-feira, 2 de julho de 2008

Matéria sobre Filosofia na revista "Isto É"

A revista IstoÉ do dia 11 de junho publicou uma interessante matéria sobre a popularização da Filosofia. Leiam trechos:

Filosofia em ALTA - Ela é disciplina obrigatória nas escolas, mania na tevê, nas empresas e até nos livros para crianças

Empresas contratam filósofos para palestras e consultorias, crianças de cinco anos travam o primeiro contato com o tema e, fora da sala de aula, adolescentes se reúnem para debater idéias de Nietzsche e Platão. Nascida na Grécia há mais de dois mil anos, a filosofia encontra terreno cada vez mais fértil no Brasil – até mesmo na tevê. No programa Fantástico, da Rede Globo, o quadro “Ser ou não ser” sobre filosofia entrará em sua terceira temporada. “A filosofia está em alta”, afirma a filósofa Viviane Mosé, apresentadora da atração. Ela, que carrega o mérito de tornar didático um tema pouco palatável, conclui: “O que está em baixa é a forma acadêmica de pensar.”

A crítica de Viviane é para o projeto de lei, recém-sancionado pelo governo federal, que obriga as escolas do País a incluir filosofia e sociologia no currículo do ensino médio. “Da maneira como o ensino é fragmentado, a filosofia vai ser mais uma decoreba sobre quem é Sócrates e quando nasceu Platão", teme ela. Mas há boas iniciativas, como a do Centro de Filosofia Educação para o Pensar - Filosofia com crianças, jovens e adolescentes, que ensina o tema para alunos a partir de cinco anos. Constituída de educadores e filósofos, o centro tem parcerias com 300 escolas do País. O método de ensino faz o aluno discutir filosofia em todas as disciplinas, e não apenas em uma matéria. “Prestamos assessoria pedagógica para professores e produzimos o material didático, que é adaptado ao nível cognitivo do aluno”, explica José Carlos Freire, assessor pedagógico do centro. Filósofo e professor da Pontifícia Universidade Católica (PUC) de São Paulo, Mário Sérgio Cortella também foca nos filósofos mirins. Ele lançará este ano O que é pergunta, seu primeiro livro sobre filosofia para crianças. O interesse do mercado editorial pelo tema é crescente.eu Platão”, teme ela.

“Por muito tempo, a tecnologia fez o mundo focar no ‘como’ em detrimento dos ‘porquês’ e, enfadadas, hoje as pessoas procuram reflexões”, explica Cortella. No ano passado, ele deu 30 palestras sobre filosofia e ética para gestores do Banco Bradesco. “Ficou chique consumir filosofia”, diz o acadêmico, que discursa ainda aos funcionários da metalúrgica Gerdau sobre a diversidade humana. No Rio, a filósofa Viviane segue o mesmo caminho. “Ajudo o executivo a ler o que acontece no mundo contemporâneo e a agir no presente”, afirma.

Entre seus clientes estão a Petrobras, a Vale, O Boticário e o Banco de Desenvolvimento do Espírito Santo, que a contratou para falar sobre ética e comprometimento aos funcionários. Um dos maiores centros de cursos livres na área de humanidade, a Casa do Saber também percebe o maior interesse pelo tema. Criada em São Paulo, hoje atua também no Rio de Janeiro e expandiu o número de cursos de filosofia de nove, em 2004, para os atuais 175.

Componente curricular excluído da escola pela ditadura em 1968, a filosofia seguiu existindo em colégios particulares, como o Santo Américo, em São Paulo, que desde 1975 ensina a disciplina. Aluna do terceiro ano do ensino médio, Gabriela Campana, 17 anos, reúne-se com amigos, durante as férias, para debater as idéias de Nietzsche e Maquiavel. E filosofa ao falar do valor do conhecimento: “Para estabelecer princípios e formar uma maneira própria de agir é preciso saber como outras pessoas pensavam o mundo e tentavam melhorá-lo.”

Sobre uma abordagem temática da Filosofia

Sustento a seguinte idéia: é inviável ensinar Filosofia sem despertar o interesse dos alunos em relação à disciplina. Em primeiro lugar porque ninguém filosofa por obrigação, e sim por um algo intrigante, que leva ao espanto - que, parafraseando Heidegger, é a arché (termo grego que designa "princípio") da Filosofia. Segundo porque o atual processo de reintrodução da disciplina (juntamente com a Sociologia) inclui uma certa suspeita negativa dos alunos para com ambas, o que prejudica o primeiro ponto - fato que já me foi provado empiricamente. Para mim se tornou lugar-comum ouvir comentários do tipo "Para que estudar Filosofia?", "Que chato, mais uma matéria para estudarmos", etc. e tal, o que gera um bloqueio importante dos alunos em relação à Filosofia.
Em vista disso, defendo (e faço uso de) uma abordagem temática da disciplina, abordagem essa que pode respeitar uma ordem histórica, sem que isso se converta em uma obrigação. Penso que trabalhar o conteúdo filosófico em unidades, baseadas em questões, torna o planejamento das aulas de Filosofia mais atraente e motivante. Considero mais viável e interessante falar de Ética, por exemplo, iniciando pela discussão do termo (questionando como os alunos o compreendem) para posteriormente apresentar a ética aristotélica, a epicurista, a estóica, o pensamento racionalista no que concerne à ética, a ética contratualista, a humeana, enfim; do que apresentar o pensamento pré-socrático, depois Sócrates, Platão, Aristóteles, etc., sem amarrar a discussão a tema algum. Claro que a abordagem histórica da Filosofia permite o trabalho com temas, mas penso que a problematização dos assuntos é facilitada pelo caminho temático propriamente dito. Desta maneira meu trabalho tem caminhado, assim tenho tentado despertar o espanto, que caracteriza a atitude filosófica, em meus alunos e outros seres pensantes.

terça-feira, 1 de julho de 2008

Meus queridos alunos filósofos!

Meus alunos muitas vezes bocejam, viram os olhos, viajam inertes em suas carteiras ao me ouvirem falar de Kant, Descartes ou Hume. Me incomodam nestes momentos de ausência de interação. Mas despertam e franzem a testa curiosamente, às vezes até sorriem, quando questionados sobre suas concepções éticas, sobre a possibilidade de agirem como agem por medo da lei... se seriam éticos caso fossem invisíveis. Saltam brilhantes de sua incômoda inércia quando pergunto o que pensam quanto a determinado assunto, para depois trabalhar os conceitos.
Meus alunos gostam de falar sobre a política de cotas nas universidades, legalização do aborto, células-tronco, preconceito, corrupção. A maioria traz, claro, opiniões de terceiros, quartos, enfim, mas gosta de discutir, de argumentar, de provocar e quase sempre demonstra também gostar de ser provocada.
Tantas vezes me levam à inquietude, me fazem dizer que não gostam de pensar, que têm preguiça de ler, que são conformistas e permitem que pensem por eles. Outras vezes, como hoje, me levam à certeza de que precisam apenas do estímulo certo para entenderem (e gostarem) de Kant, Hume, Descartes.
Hoje fui surpreendida pelas apresentações de seus trabalhos. Houve comprometimento, e penso que só há comprometimento quando há interesse. E houve o estímulo, visto que os temas de trabalho, elaborados pela professora Flávia, minha companheira de profissão, foram muito felizes (A questão da ética quanto aos profissionais do aborto, preconceito homossexual, o debate ético quanto à educação sexual na escola). Nenhum dos temas fez alusão a alguma corrente filosófica, ou a algum pensador. Contudo, penso que filosofar não é debruçar-se diante de textos de pensadores consagrados, pesquisá-los, enumerá-los ou apenas entendê-los e ponto. Filosofia é movimento, ação, é análise crítica, passagem do senso comum para o bom senso.
Parabéns a vocês, mentes pensantes e corpos ativos! Desejo sincera e imensamente que permaneçam no desenvolvimento de seu senso crítico, caminho que, creio, vocês já começaram a trilhar.

segunda-feira, 23 de junho de 2008

Síndrome de Burnout em professores



Este artigo, que recebi por e-mail, diz respeito a estatísticas, sintomas e condições favoráveis ao desenvolvimento da Síndrome de Burnout em professores. É importante, companheiros educadores, que analisemos nossas atitudes e reações referentes à prática profissional (em sala de aula e fora dela), pois estes sintomas têm atingido um grande número de professores da educação básica. Fiquemos atentos!


Síndrome de burnout atinge 15% dos professores.

Uma pesquisa feita com mais de 8 mil professores da educação básica da rede pública na região Centro-Oeste do Brasil revelou que 15,7% dos entrevistados apresentam a síndrome de burnout, que reflete intenso sofrimento causado por estresse laboral crônico. A enfermidade acomete principalmente profissionais idealistas e com altas expectativas em relação aos resultados do seu trabalho. Na impossibilidade de alcançá-los, acabam decepcionados consigo mesmos e com a carreira.

O estudo confirma a vulnerabilidade do docente à síndrome, pois o excesso de exigências auto-impostas, associadas a condições precárias de trabalho, bem como à falta de retribuição afetiva, expõem o profissional a um desgaste permanente. Assim, a tensão gerada entre o desejo de realizar um trabalho idealizado e a impossibilidade de concretizá-lo acaba por levar o profissional a um estado de desistência simbólica do ofício.

Essa condição, mostrada em pesquisas anteriores, é confirmada por um estudo realizado pela psicóloga Nádia Maria Beserra Leite. Ela analisou 8.744 questionários, respondidos por professores de ensino fundamental e médio, como parte do seu mestrado no Instituto de psicologia (IP) da Universidade de Brasília (UnB), sob orientação do professor Wanderley Codo.

Nádia é cautelosa quanto à generalização dos resultados, mas considera os dados preocupantes. “Obter 15,7% num universo de 8 mil não é desprezível”, afirma. Caso o índice seja o mesmo em todo o País, por exemplo, então mais de 300 mil professores brasileiros convivem com a síndrome, isso somente no ensino básico. Entre outras conseqüências, tal cenário levaria a um
sério comprometimento na educação de milhões de alunos.

Os dados vieram à tona com informações obtidas por um questionário que permite identificar a incidência dos três sintomas que caracterizam a síndrome: exaustão emocional, baixa realização profissional e despersonalizaçã o. Com relação ao primeiro sintoma, 29,8% dos professores
pesquisados apresentaram exaustão emocional em nível considerado crítico. Quanto à baixa realização profissional, a incidência foi de 31,2%, enquanto 14% evidenciaram altos níveis de despersonalização.

Suscetibilidade

A síndrome de burnout pode afetar qualquer profissional. Porém, é mais comum em pessoas que desenvolvem atividades de constante contato humano, principalmente aquelas que favorecem o envolvimento emocional. Nesse grupo estão, por exemplo, médicos, enfermeiros e professores, profissões que lidam com ideais ambiciosos e situações que nem sempre podem ser resolvidas por eles próprios, seja manter alguém vivo ou promover transformações sociais.

Os problemas surgem à medida que esses objetivos não se concretizam. “É como aquela professora que pensa em contribuir para mudar a vida dos estudantes, muitas vezes reproduzindo a dedicação que teria com os próprios filhos, mas não se sente retribuída”, explica Nádia. Também se enquadra nesse perfil o professor que espera dos alunos um ótimo aprendizado do conteúdo por ele transmitido em sala de aula. Esforça-se para isso e o eventual desinteresse ou baixo rendimento dos alunos é percebido por ele como um fracasso pessoal. “Então, vem o desânimo e o cansaço”, diz a pesquisadora.

Sintomas

De acordo com Nádia, o primeiro sinal de instalação da síndrome é a exaustão emocional. Afetivamente, significa que o docente não consegue mais se doar. “Ele percebe o esgotamento da energia e dos recursos emocionais.” Quando não consegue lidar com essa sensação, desenvolve
mecanismos reativos. Como alternativa ao sofrimento, acaba por se distanciar emocionalmente, tanto do seu trabalho quanto do próprio aluno. O distanciamento do trabalho, ou baixa realização profissional, caracteriza- se pela falta de envolvimento pessoal e pela indiferença aos assuntos da sua profissão, além de uma assumida sensação de ineficácia contra a qual não tem ânimo para lutar. O distanciamento do aluno, ou despersonalizaçã o, aparece na forma de endurecimento afetivo e falta de empatia.

Para a pesquisadora, a despersonalizaçã o é a face mais perversa do burnout, pois afeta justamente aquele que deveria ser objeto de atenção e cuidado. Nádia exemplifica a situação citando docentes que se referem às turmas como “aqueles pestinhas”, ou que, na hora do cafezinho, tudo o que conseguem fazer é reclamar dos alunos. Qualquer referência aos estudantes
será sempre negativa.

Consequências

De acordo com a psicóloga, estudos vêm mostrando que professores com o problema tendem a adoecer mais, faltar ao trabalho e se tornar menos criativos. Em sala de aula, há grandes chances de piorar a relação professor-aluno. Uma relação de hostilidade entre os dois lados acabará comprometendo a aprendizagem.

Segundo Nádia, a presença do burnout em professores da educação básica levanta preocupações. “Esse período escolar acompanha uma fase essencial da formação do indivíduo. É quando a relação aluno-professor é mais necessária para a aprendizagem e o desenvolvimento integral do educando”, afirma. Já os estudantes universitários são mais independentes da figura
do docente.

Apoio

O estudo analisou formas de minimizar a síndrome e descobriu ser fundamental o companheirismo e a cooperação no ambiente de trabalho. Os professores que disseram ter apoio dos demais docentes apresentaram os menores níveis de exaustão emocional, despersonalizaçã o e de baixa realização profissional. A freqüência de exaustão entre indivíduos sem suporte é quase o dobro da verificada em professores que percebem estar apoiados pelos seus pares. Quanto à despersonalizaçã o e à realização profissional reduzida, os dados seguem a mesma tendência: a incidência desses sintomas é três vezes maior entre os docentes que não se sentem apoiados pelos colegas.

Soluções

Segundo Nádia, os resultados do estudo serão úteis em estratégias de enfrentamento da síndrome. Ela considera que medidas simples podem contribuir para minimizar o sofrimento. “O mérito desse trabalho é ter mostrado, de forma científica, que é muito mais difícil enfrentar de forma solitária os estressores que levam a burnout”, diz a psicóloga. “Encontramos evidências de que o suporte social no trabalho, que favoreça a construção coletiva de estratégias de enfrentamento dos problemas típicos da profissão, é uma maneira efetiva de reduzir as estatísticas da síndrome.”

Nádia afirma, ainda, que esse recurso tem o mérito de ser acessível aos professores, pois depende da vontade do grupo. Atividades que estimulem a aproximação entre professores podem contribuir para evitar a tendência a expectativas profissionais inalcançáveis, substituindo- as por metas realistas e discutidas coletivamente. Mesmo a ausência de condições de trabalho adequadas pode ser minimizada pela busca em grupo de soluções criativas, deixando de ser apenas uma queixa isolada. “É muito importante a sensação de ser acolhido por pessoas que enfrentam os mesmos problemas, seja na busca por mudanças ou para conviver com o que é impossível mudar”, diz.

Família potencializa síndrome

O eterno conflito entre trabalho e família é o principal elemento para desencadear a síndrome, revela a pesquisa. Isso acontece quando o professor se dedica mais do que poderia para a escola, reduzindo o tempo destinado à esposa (ou marido) e filhos, ou vice-versa. Do total de entrevistados com exaustão emocional alta, 74% indicaram vivenciar problemas para conciliar o tempo e a atenção que dedicam a essas duas instâncias tão importantes da sua vida.

Nádia destaca que esse resultado é uma indicação de quanto o trabalho docente tende a invadir o tempo que deveria ser dedicado ao lazer e aos cuidados com a família. Da maneira como o trabalho está estruturado na maioria das instituições, não há tempo, dentro da carga horária prevista, para que sejam realizadas atividades como preparar aulas, pesquisar materiais, bem como corrigir provas e trabalhos, tarefas que são levadas pra casa. Quando não consegue equacionar o problema, o professor passa a ser submetido a uma pressão em seu ambiente doméstico. Assim, já fragilizado pelos problemas que enfrenta no trabalho, fica mais exposto aos efeitos que levam a burnout.

Fonte: Agência UnB

Publicado em: 19/06/2008

terça-feira, 17 de junho de 2008

A tão difícil "autoridade"...

Um dos principais problemas em lecionar Filosofia é também um dos principais problemas em lecionar. Falo do tema "autoridade", termo de que, confesso, não gosto. A mim repulsa a idéia de que preciso subir no tablado, exigir silêncio, usar a questão das notas bimestrais como razão para que estejam atentos. Gosto de tratar meus alunos como meus pares. E quero que estejam atentos pelo tema trabalhado em si, que além disso não apenas mantenham a atenção no que digo, mas que digam. Talvez eu pareça idealista, talvez eu seja. Se minha didática funciona? Não sei responder.
É fato, porém, que nem todos se adaptam à minha postura. Nesse "nem todos" devo incluir certas partes da instituição escolar e certo número de alunos. Muitas instituições exigem a tradicional postura de mestre. Muitos alunos ainda estão imaturos para compreender que o conhecimento é uma construção e que, para isso, todos devem estar comprometidos.
Penso na possibilidade de que essa questão seja mais problemática para a Filosofia, visto que ela foi recentemente incorporada ao currículo escolar e, por isso, os alunos tendem a encará-la de forma diferente em relação às demais. Será isso? Boa pergunta, não? Não é verdade que a Filosofia geralmente é vista como desnecessária, gratuita e dispensável?
O posicionamento do professor em sala de aula é algo um tanto quanto complicado. Estou ainda construindo a minha didática e a idéia do tipo de professora que desejo ser, o que pretendo representar para os meus alunos. Apenas estou certa de que quero instigá-los, provocá-los, incomodá-los. Fazer com que suas macias poltronas da apatia se tornem extremamente desconfortáveis. Quero que pensem por si sós. Trabalho árduo, desafiante. Assim é educar. Se vale a pena? Acredito e gosto de acreditar que sim.

sexta-feira, 13 de junho de 2008

Apresentação e boas vindas

Saudações!
Sou Juliana Gama e leciono Filosofia para turmas de Ensino Médio. Minha experiência nesta função me concede a oportunidade de vivenciar fatos interessantes, irreverentes, intrigantes, enfim, de inúmeros possíveis adjetivos... fatos esses que, sem dúvida alguma, se repetirão indefinidamente. A vontade de dividir tais experiências, compartilhar dúvidas e informações relevantes no que se refere ao ensino de Filosofia (e muitas destas ao ensino em geral), é a razão central para a criação deste blog.

Lecionar Filosofia é um trabalho simultaneamente árduo e instigante. Lidamos com valores, muitas vezes arraigados, e por isso nos deparamos com diferentes universos, quase sempre conflitantes entre si e conflitantes com os nossos próprios. Porém é estimulante e sublime perceber o quanto a atitude filosófica, que conseguimos desenvolver nos alunos (é claro que em nem todos) os leva a crescer, a desenvolver a inquietude quanto a tudo o que os cerca. Nosso trabalho é conduzi-los ao incômodo, à indignação, a uma (ou várias) nova(s) visão (ões) em relação a seu entorno. E isso muitas vezes leva à análise crítica de nossa própria prática enquanto educadores, esse é o nosso retorno, certamente um grande estímulo.